Nota Editorial
Resumo
A cada edição, a Revista Ciência & Trópico reafima seu caráter interdisciplinar, que traduz um dos seus fundamentos. Traz, neste volume, importantes reflexões sobre Antropologia, Educação, Literatura, Cultura, Economia, dentre outros temas que envolvem a característica multidisciplinar dos artigos e da revista. O comitê editorial tem a honra, portanto, de publicar seu vol. 42, n. 1 do ano de 2018, que é resultado do seu fluxo contínuo, com hospedagem no portal de periódicos da Fundação Joaquim Nabuco.
Introduzindo esta edição, o Dr. Roque de Barros Laraia, em Primórdios da Antropologia brasileira, resume a história da Antropologia Cultural no Brasil, a partir do final do século XIX até os meados da década de 70 do século passado, que, em função do surgimento tardio das universidades em nosso país, encontrou abrigo nos Museus. Entre os pontos destacados pelo autor, está o de que, com raras exceções, os primeiros pesquisadores antropólogos foram médicos, como é o caso de Nina Rodrigues (1862-1906). O autor ainda aponta que somente a partir da década de 70 do século XX, é que as Universidades passam a considerar a Antropologia como área de estudo. Ele finaliza o artigo com uma homenagem ao patrono da Fundação joaquim Nabuco, citando o texto “A escravidão”, no qual Nabuco utilizou argumentos que seriam encampados por qualquer cientista social ao criticar o tratamento desigual da justiça em relação aos escravos.
Os autores Christiane Spiel, Simon Schwartzman, com a colaboração de outros citados no artigo, analisam A contribuição da educação para o progresso social. Sabe-se que educação é o processo de aprendizagem e expansão da cultura que, ao contribuir para a melhoria da condição humana, é um componente central do progresso da sociedade. Foi trazida à discussão a promoção, pela educação, do progresso social por meio de quatro dimensões: humanísticas; cívicas; democráticas; e práticas. Afirmam que a expansão da educação formal, que fez parte do surgimento dos estados-nações e das economias modernas, é um dos indicadores mais visíveis do progresso social. O texto apresenta os principais dilemas e ações necessárias para que a educação corresponda a suas promessas. As políticas de educação informadas pelos conhecimentos criados pela pesquisa social devem conduzir a mais equidade e produtividade, dando ênfase aos seus objetivos cívicos e humanísticos, com especial atenção à formação de professores. Os autores concluíram, portanto, que as estruturas de governança devem ser flexíveis, participativas, responsáveis e conscientes do seu contexto social e cultural, e que, para se alcançar o objetivo de desenvolvimento sustentável, será necessário expandir o acesso e melhorar a qualidade da educação infantil; aprimorar a qualidade das escolas, nas suas diversas perspectivas; fortalecer o papel dos educadores; e tornar os ensinos superior e profissional mais inclusivos e socialmente relevantes.
Em Diferença, cultura e educação: caminhos e descaminhos, Sandro Guimarães de Salles e Conceição Gislane Nóbrega Lima de Salles versam sobre as discursividades nas Ciências Humanas e Sociais, que é um marco da Revista ciência & Trópico, levando em conta a diferença étnica e cultural, perscrutando sua relação com a educação. Os autores partem do princípio de que esse debate se faz cada vez mais necessário, considerando a emergência, nas últimas décadas, de políticas destinadas a criar oportunidades iguais para grupos étnicos historicamente excluídos. Outras questões são suscitadas relativas à obrigatoriedade do ensino, na educação básica, da história e cultura afro-brasileira e indígena. Eles trazem uma diferença para além de uma vinculação direta a traços culturais ou étnicos, predeterminados e fixos. Demonstram como as práticas discursivas sobre a diferença serviram, e ainda servem, à manutenção das relações de poder.
Válter Gomes, Maria de Lourdes Machado-Taylor e Ernani Viana Saraiva, por sua vez, apresentam um breve histórico e caracterização da educação superior brasileira, buscando compreender os determinantes da situação atual com vistas a uma adequada política educacional para o setor, por meio de uma reflexão teórico-metodológica apoiada na perspectiva histórica, no artigo intitulado O ensino superior no Brasil: breve histórico e caracterização. Os autores afirmam que a abertura do Ensino Superior privado, a partir de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), propiciou a expansão no número de Instituições e de alunos ingressantes, configurando grande influência da sociedade capitalista globalizada sobre a educação superior brasileira, dando origem ao fenômeno de mercantilização, que é questionada por alguns autores. Por conseguinte, com o levantamento teórico da situação do ensino superior brasileiro, pretende-se contribuir para futuras reflexões sobre as demandas contemporâneas com vistas a uma adequada política educacional para o setor.
Em A presença de Pernambuco na obra de Raul Pompeia, Ricardo Japiassu investiga o que o ficcionista constante no título deste artigo escreveu sobre o Recife quando aqui residia, tendo em vista que, tendo sido expulso da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco em São Paulo, radicou-se no Recife para concluir o curso universitário. Ressaltam-se, nas invetigações, as reinvenções sobre os carnavais, especificamente os desfiles de maracatus, as Canções sem Metro e todas as manifestações literárias de inspiração pernambucana. O artigo é finalizado com um lamento pela morte de Raul Pompeia e uma declaração do mesmo: “à Notícia e ao Brasil declaro que sou um homem de honra”.
Com o artigo O moderno e o tradicional no agreste de pernambuco, Elisabeth Cavalcante dos Santos e Diogo Henrique Helal realizam discussão teórica sobre como tem se configurado a modernidade no Nordeste brasileiro e, em particular, no Agreste de Pernambuco, avaliando sua construção histórica e social. Partem, então, do pressuposto de que a modernização se deu de forma híbrida nessas realidades sociais, mesclando elementos modernos e tradicionais. Os autores concluem que, no Nordeste, foi possível observar ações modernizantes do Estado ao longo de sua história que se mesclam com ações tradicionais de família e de classe, e destacam que, no Agreste de Pernambuco, a principal marca do hibridismo é a convivência de modos informais e precários de trabalho com o crescimento econômico da região e consequentes exigências por profissionalização.
No artigo Inovação social no setor público e instituições de accountability: um estudo da Controladoria-Geral do Estado de Pernambuco, Saulo Diógenes Azevedo Santos Souto e Rezilda Rodrigues Oliveira discorrem sobre questões relacionadas à inovação social no setor público decorrentes da visão interdisciplinar que conjuga design institucional, positividade organizacional e controle interno, com o objetivo de estudar a Secretaria da Controladoria-Geral do Estado de Pernambuco (SCGE/PE) sob o duplo olhar de sua configuração como organização positiva e instituição de accountability. Importantes fatores histórico-institucionais foram discutidos, em paralelo com o exame de temas básicos do funcionamento desse órgão de controle interno, associados a valores pessoais e organizacionais, bem como experiências positivas e grandes realizações, muitas delas relacionadas ao desenvolvimento de competências apreciativas, típicas de organizações positivas. Consequentemente, os autores constataram que o estudo da SCGE/PE pode ser configurado como um caso de inovação social no setor público, reunindo fortes características encontradas em organizações positivas, associadas a alguns aspectos indicativos das instituições pautadas pela accountability.
Concluindo o repertório de artigos selecionados para esta edição, Marcelo Sampaio de Alencar apresenta uma análise do processo de privatização, incluindo os antecedentes históricos de privatizações, no artigo Uma análise dos resultados econômicos e fiscais da privatização das empresas estatais de telecomunicações. Foram apurados os resultados das privatizações em termos de acúmulo de poder e riqueza pelas empresas. Investigaram-se também os investimentos das empresas, os resultados obtidos, e o impacto da privatização nos impostos do Brasil. O autor finaliza o artigo afirmando que, com a venda das empresas estatais de telecomunicações, o governo abdicou de uma receita considerável em termos de tarifas, o que o obrigou a aumentar os impostos ano a ano.
A Revista Ciência & Trópico reitera, a cada publicação, seu principal objetivo, que é promover o debate e a circulação de conhecimento nas diversas áreas de pesquisa. Assim, a Revista faz-se como um espaço multidisciplinar que busca compartilhar produções intelectuais no âmbito nacional e internacional, integrando as mais diversas áreas do conhecimento.
Alexandrina Sobreira de Moura
Editora-Chefe